
Devia ser um amor comum, como os básicos que simplesmente dão certo. Tinham ali toda gama de ingredientes necessários. Um sexo louco, o sentimento clássico, a intensidade juvenil, o prazer da descoberta, os objetivos futuros conjuntos.
Poderia ser tudo, mas por alguns períodos foi nada.
Separaram-se inúmeras vezes, nunca querendo, de fato, estar longe. Acostumaram-se em outras camas, em outros afetos, em outros laços, e assim, desfizeram o nó que os prendia.
Nenhum dos dois sabia para onde o outro iria, não era preciso saber.
Ela o culpou, culpou os outros, os destinos, os astros. Culpou a Deus. E com o tempo, inerte na dor exorcisou toda culpa e voltou a viver. Pegou seu quinhão da história e deixou o restante a quem interessase. O silêncio prosseguiu. Mais de 700 dias, nem cartas, nem mails, nem notícias vindas dos amigos. Nunca se cruzaram, nem mesmo nos lugares comuns. Acostumaram-se.
Sem conhecer a versão dele, ela apenas dizia:
não tinha que ser, não foi. Era a forma simplista com a qual justificava as distâncias forçadas. E para ausentar o choro começou a gargalhar. Era assim que sabia fazer. Nunca diferente. Deu de ombros para a balela auto-ajuda. Porém, foi discretamente surpreendida por rastros daquilo que chamam de saudade. Não entendia, não sentia, achava besteira. Besteira como foi acreditar que algum dia aquilo era romance, era história, era algo além.
Perfumou-se, vestiu seu melhor vestido e foi amar outros amores. Repetiu o ritual tantas vezes, quantas fosse necessário. Estava curada, julgava-se pronta. Não errou, não hesitou.
Num dia de coragem, permitiu-se ser inconsequente. Arriscou, veio o convite, voltou a magia. De volta aqueles momentos que eles só sabiam ser eles. E sabiam ser tudo. E transformavam-se em nada. Porque existia algo maior, grandioso e valioso que tomava aquele espaço físico e coordenava toda química.
Descobriram-se amigos, como nunca haviam deixado de ser. Descobriram-se atração, fogo, desejo. Nada consumado. Eram começo, eram paciência, eram respeito. Jóia, ou brinquedo novo, que se toca com mãos cuidadosas, cheios de melindres para não danificar. Foram medo, autodefesa, um tanto de melancolia. Medo, vontade. Medo, desejo, Medo, segredo. Medo, ansiedade. Não queriam o passado, não sabiam ser presente, não ansiavam o futuro. Qualquer maconha barata poderia ter o mesmo efeito passageiro como teve aquele sabor perdido do algodão-doce, ou do cheiro da orquídea que já não perfumava mais a sala.
Não ouviram o suficiente. Tornaram-se adultos cedo demais, e perderam toda aquela ingenuidade infantil que caía, machucava, e voltava a brincar. Tornaram-se chatos, cautelosos ao extremo. Como se a magia fosse um lance de ações na Bolsa de Valores.
Não souberam? Não queriam? Ela crê que não. Ele pediu: não vá embora. Não saia da minha vida. Ela se rendeu e decidiu ficar, mas não da forma como queria, mas do jeito que pôde. Os mais otimistas continuavam na torcida.
Ela chorou algumas noites, mas agora tinha o consolo de saber que ele também choraria. Perante ele, permaneceu em silêncio. Disse que colocaria um belo sorriso no rosto, o seu melhor perfume, um zíper nos lábios da paixão…e nada mais ele saberia.
Desejava, mas havia perdido forças. Ou talvez as tivesse substituído pelo respeito à decisão alheia. Foi assim, por cautela ou pela falta de força de vontade. Guardaram lá no universo paralelo as lembranças, o desejo, a dor e aquele amor em repouso. Era ali, o lugar mais seguro, onde talvez, se amariam por mais a vida toda. O lugar onde nada, nem ninguém, nem mesmo eles poderiam destruir. Talvez tenha sido melhor assim.
(Qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência)