
Tal ciúme me fazia deboche de parentes, que "brincavam" dizendo que mamãe ia cortar a barriga dele. Aliás, isso foi muito usado pelas coleguinhas da rua. Chorava muito cada vez que ouvia a história.
Eu cria em bobagens assim. Meu universo lúdico servia para o bem e para o mal. Juro que vi Papai Noel trazer minha primeira bicicleta, mas sofria só em pensar perder meu pai. Em erros e acertos, me orgulho disso. Nos tornamos cúmplices. Ele compra meus sonhos. Vive com os pés no chão e a cabeça nas estrelas. Como eu! A racionalidade pertence a minha mãe. Nós somos os loucos. Acreditamos na fantasia.
"Meu primeiro porre" foi com ele também. Durante um passeio, parou num bar. Brincando deu-me uns dois goles de sua cerveja e esqueceu de avisar minha mãe, que sem saber, deu mamadeira por cima. Isso mesmo: mamadeira. Eu tinha 1 ano e meio.
Era natural ficarmos grudados todo tempo. Comer manga verde com sal, repassar as lições da escola, tomar banho de piscina o dia inteiro, sair para "explorar" as florestas do bairro ou dormirmos juntos quando eu tinha medo dos filmes de terror na madrugada. Mas tinha a parte que ensina, disciplina, estimula a leitura, a assistir o telejornal, esmiuçar a parte de política e economia dos impressos. Essas coisas de pai!
Anos depois, na colação, gritei do palco, que era por ele. Anos antes, vi seus olhos marejados na valsa da festa de 15 anos. Tempos depois, chorou novamente ao ver outro homem me fazer sofrer. Ano passado, ficou frágil, na cama do CTI, após a cirurgia do câncer. Eu choraria de medo, deveria ter chorado, mas fui só sorrisos, quando a única coisa que a anestesia o deixou falar foi: olha enfermeira, essa é minha filha. Ela é jornalista. Ela é jornalista!
Minha infância tem a lembrança daquele homem que diz, sem abrir a boca: vai em frente, tudo vai dar certo. E para completar o incompleto, ainda tenho a certeza que a segunda frase do post está no tempo verbal errado. Não amava. Eu amo!